Elegias - Xenófanes de Colofão

Agora o chão da casa está limpo, as mãos de todos
e as taças; um cinge as cabeças com guirlandas de flores,
outro oferece odorante mirra numa salva;
plena de alegria, ergue-se uma cratera,
à mão está outro vinho, que promete jamais faltar,
vinho doce, nas jarras cheirando a flor;
pelo meio perpassa sagrado aroma de incenso,
fresca é a água, agradável e pura;
ao lado estão pães tostados e suntuosa mesa
carregada de queijo e espesso mel;
no centro está um altar coberto de flores,
canto e graça envolvem a casa.
É preciso que alegres os homens primeiro cantem os Deuses
com mitos piedosos e palavras puras.
Depois de verter libações e pedir forças para realizar
o que é justo - isto é que vem em primeiro lugar-,
não é o excesso beber quanto te permita chegar
à casa sem guia, se não fores muito idoso.
É de louvar-se o homem que, bebendo, revela atos nobres
como a memória que tem e o desejo de virtude,
sem nada falar de Titãs, nem de gigantes,
nem de centauros, ficções criadas pelos antigos,
ou de lutas civis violentas, nas quais nada há de útil.
Ter sempre veneração pelos Deuses, isto é bom.


Elegias. DK 21 B 1-9. 
Trad. Anna L. de A. Prado

 DIJCK, Floris Claesz van - Vida-Repousada com Frutas e Queijo - 1613 -
Óleo sobre Tela



Árvores, por António Ramos Rosa


O que tentam dizer as árvores
no seu silêncio lento e nos seus vagos rumores,
o sentido que têm no lugar onde estão,
a reverência, a ressonância, a transparência
e os acentos claros e sombrios de uma frase aérea.
E as sombras e as folhasn são a inocência de uma ideia
que entre a água e o espaço se tornou uma leve integridade.
Sob o mágico sopro da luz são os barcos transparentes.
Não sei se é o ar se é o sangue que brota de seus ramos.
Ouço a espuma finíssima das suas gargantas verdes.
Não estou, nunca estarei longe desta água pura
e destas lâmpadas antigas de obscuras ilhas.
Que pura serenidade da memória, que horizontes
em torno do poço silencioso! É um canto num sono
e o vento e a luz são o hálito de uma criança
que sobre um ramo de árvore abraça o mundo.

António Ramos Rosa. Animal Olhar, Árvores, p. 84.

Cláudio Manuel da Costa - Soneto XIV

Quem deixa o trato pastoril amado
Pela ingrata, civil correspondência,
Ou desconhece o rosto da violência,
Ou do retiro a paz não tem provado.

Que bem é ver nos campos transladado
No gênio do pastor, o da inocência!
E que mal é no trato, e na aparência
Ver sempre o cortesão dissimulado!

Ali respira amor sinceridade;
Aqui sempre a traição seu rosto encobre;
Um só trata a mentira, outro a verdade.

Ali não há fortuna, que soçobre;
Aqui quanto se observa, é variedade:
Oh ventura do rico! Oh bem do pobre!


Claros y Frescos Ríos - Juan Boscán

 


 

Claros y Frescos Ríos
Juan Boscán



Luys de Narváez - Guardame las Vacas


Luys de Narváez - Guardame las Vacas
Artista :

Cada árvore é um ser para ser em nós, por António Ramos Rosa

Cada árvore é um ser para nós
Para ver uma árvore não basta vê-la
a árvore é uma lenta reverência
uma presença reminiscente
uma habitação perdida
e encontrada
À sombra de uma árvore
o tempo já não é o tempo
mas a magia de um instante que começa sem fim
a ávore apaziga-nos com sua atmosfera de folhas
e de sombras interiores
nós habitamos a árvore com nossa respiração
com a da árvore
com a árvore nós partilhamos o mundo com os deuses.


Do livro, Cada árvore é um ser para ser em nós.

Jan Both - Contemplações.


Nas artes contemplativas apenas interessa o fato estético. 
Nas transparências, as profundezas do Ícone.
Contemplação é convívio.


 Paisagem italiana com desenhista. c. 1650
Óleo sobre tela,, 187 x 240 cm - Rijksmuseum, Amsterdã
(clique para ampliar)

Jan Both pintou paisagen sensíveis. Campos idílicos e serenos, habitados por paisanos, camponeses, tropeiros e viajantes. Os tons do entardecer em seus quadros criam um mundo transcendente, frugal e contemplativo. A contemplação contínua de seus quadros é um exercício espiritual de serenidade.

Para uma observação mais minuciosa deste quadro em ambiente virtual visite este link: googleartprojec


Canção de Espanha e Lugar Ameno


Al son de los arroyuelos
Canção de José Marin & Poema de Lope de Vega
Camerata Ibéria




Al son de los arroyuelos
cantan las aves de flor en flor,
que no hay más gloria que amor
ni mayor pena que celos.

Por estas selvas amenas
al son de arroyos sonoros
cantan las aves a coros
de celos y amor las penas.

Suenan del agua las venas,
instrumento natural,
y como el dulce cristal
va desatando los yelos,
al son de los arroyuelos
cantan las aves de flor en flor,
que no hay más gloria que amor
ni mayor pena que celos.

De amor las glorias celebran
los narcisos y claveles;
las violetas y penseles
de celos no se requiebran.

Unas en otras se quiebran
las ondas por las orillas,
y como las arenillas
ven por cristalinos velos,
al son de los arroyuelos
cantan las aves de flor en flor,
que no hay más gloria que amor
ni mayor pena que celos.

Arroyos murmuradores
de la fe de amor perjura,
por hilos de plata pura
ensartan perlas en flores.

Todo es celos, todo amores;
y mientras que lloro yo
las penas que Amor me dio
con sus celosos desvelos,
al son de los arroyuelos
cantan las aves de flor en flor,
que no hay más gloria que amor
ni mayor pena que celos.


Vem, suspirar ao verde prado...

Venid a suspirar al verde prado é uma imersão renascentista no espírito do locus amoenus. O convite essencial está manifesto no primeiro verso, e este primeiro verso enche a canção dos humores pastoris. Os verdes prados são tanto literais quanto imaginários, a reportar ao mundo espiritual. Venid a suspirar al verde prado é uma canção preciosa de encantamento contemplativo.

Cancionero Musical de Belém - nº 5
Venid a sospirar al verde prado 
Anônimo. Sec. XVI



Venid a suspirar al verde prado,
comigo zagaleja y vos pastores.
Pues muero sin morir de mal d'amores.

Tu eres soledad que esta comigo,
saberes que es padescer novos dolores.
Pues muero sin morir de mal d'amores.

Venid, que el buen pastor ya dió su vida,
con que libró de muerte su ganado,
y dale de beber a su costado.


Eu vos rogo, ó cretenses, vinde ao Templo

ANDRIESSEN, Jurriaan
1780
Oil on canvas, 194 x 89 cm

Eu vos rogo, ó cretenses, vinde ao Templo  
Blog do Jayme Bueno

Eu vos rogo, ó cretenses, vinde ao Templo:
ao redor há um bosque de macieiras,
e de altares sempre se levantam odor do incenso.

Aqui a água fria rumoreja calma,
em meio ao ramos; cobre este lugar
uma sobre de rosas; cai o sono
das folhas trêmulas.

Aqui num campo onde os cavalos pastam
desaboracham as flores do carvalho
e os anetos exalam seu aroma
igual ao mel.

Apanhando grinaldas, vem, ó Cípris,
e dá-me um pouco desse claro néctar
que tão graciosa serves para a festa, em taças de ouro.

Sappho 


Guardame Las Vacas, Luis de Narvaez




Luis de Narvaez
Guardame Las Vacas
Ronald Fuchs Gitarre, classic-arietta

Um minuto apenas de Calma e Escuta







Gaspar Sanz
Matachin
Ronald Fuchs Gitarre, classic-Arietta